A imagem mais famosa de Brasília, especialmente quando observada do alto ou em mapas, é a de um avião em pleno voo. O Eixo Monumental seria a fuselagem, enquanto as Asas Sul e Norte formariam as asas. Essa interpretação se consolidou como um dos mitos fundadores da capital federal, reforçando a visão de uma cidade moderna, planejada e orientada para o futuro.
No entanto, a verdadeira inspiração por trás do formato do Plano Piloto é mais complexa — e, segundo seu autor, Lúcio Costa, bem diferente do imaginário popular.
A Cruz, a Borboleta e o Avião
No Memorial Descritivo do Plano Piloto, apresentado em 1957, Lúcio Costa afirmou de forma categórica que o desenho da cidade nasceu do sinal da cruz, um gesto simples de tomada do território. A ideia inicial era um traçado ortogonal, baseado em dois eixos que se cruzavam.
O formato que hoje lembra um avião surgiu da adaptação desse traçado à topografia do local e à evolução do próprio projeto. O eixo curvo — que deu origem às “asas” foi concebido para acompanhar a margem do Lago Paranoá e possibilitar uma melhor distribuição das superquadras residenciais.
Em diferentes declarações, Lúcio Costa chegou a comparar o desenho da cidade a uma borboleta ou a um pássaro em voo, mas nunca a um avião. A associação com a aeronave, embora sedutora, nasceu da percepção popular e acabou transformando-se em mito. Urbanistas e especialistas reafirmam: a referência ao avião não aparece em nenhum documento original do projeto. Ainda assim, a silhueta vista do espaço é tão sugestiva que a interpretação se perpetuou.
A persistência desse mito é, por si só, uma demonstração do poder simbólico da imagem e da capacidade de Brasília de inspirar narrativas que evocam modernidade, ousadia e imaginação.

